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Carta do Estrategista de Investimentos – janeiro/2021

Carta do Estrategista de Investimentos – janeiro/2021

O ano de 2020 sem dúvida foi singular. Em retrospectiva, começou com eventos geopolíticos imprevisíveis como a execução do terrorista Qassem Soleimani, comandante da Guarda Revolucionária do Irã. Atônitos, presenciamos o preço do barril do petróleo ser negociado a valor negativo, ou seja, literalmente os investidores estavam remunerando quem quisesse, e pudesse, receber o combustível fóssil que ainda é insumo principal da matriz energética global! É claro que algo tão absurdo foi momentâneo e consequência de um desarranjo no mercado de futuros da commodity.

 

Porém, esses eventos extraordinários se tornaram quase esquecíveis diante de algo invisível, como o vírus, COVID-19, que se impôs como marco histórico. Poder-se-ia escrever um tratado sobre como ele se espalhou por todos os continentes, esmiuçando em detalhes a tragédia sanitária que culminou em milhões de óbitos diretos e empobrecimento devido à paralização da economia em escala global, mas há um ponto merece destaque nesta narrativa no tocante à gestão de ativos.

 

Em especial, a ocorrência da pandemia, absolutamente imprevisível e, portanto, imprevista, fez com que todo o cenário desenhado para subsidiar as estratégias de investimento estivesse errado! Assim, entre os superlativos que rodeiam o ano de 2020, também pode-se citar o colossal descompasso entre a realidade que se concretizou e aquilo que fora esperado.

 

Neste sentido, não há o que fazer, senão um mea culpa, pelo erro cometido. Sinceramente, uma lástima.

 

Entretanto, ainda nas reflexões dos desafios enfrentados ano passado, uma forte memória afetiva toma de assalto meus pensamentos. Lembro-me de meu avô ensinando que, na vida, não devemos nos medir apenas por resultados, mas por empenho. Por isso, dizia ele, há vitórias sem mérito das quais não devemos nos locupletarmos pois sabemos, em nosso íntimo, que não são frutos de nossos melhores esforços, mas apenas de aleatoriedades oportunas.

 

Em contrapartida, e com sua sabedoria anciã, ele enfatizava que, tampouco, devemos nos penitenciar diante dos erros. E explicava que ter ciência de que houve dedicação e empenho máximos, na realização de algo, garantiria serenidade e sossego, mesmo diante de eventuais adversidades. E mais, ele dizia ter certeza de que sofreríamos diante de nossos fracassos, mas que era imprescindível lembrar que, às vezes, o nosso melhor não seria o suficiente.

 

Finalmente, ele concluía seu ensinamento dizendo que precisaríamos de muita humildade para reconhecer nossas limitações e que, apensas diante dos erros, e não dos acertos, é que a vida nos ofereceria a oportunidade de aprendizado, aperfeiçoamento e, consequentemente, desenvolvimento.

 

Desta forma, com certeza, 2020 sintetizou bem esse esquema de construção de habilidades. Aliás, mais de uma vez já foram citadas as inúmeras noites em claro de estudo e acompanhamento dos mercados, começando de madrugada na Ásia, atravessando as primeiras horas da manhã com Europa e seguindo expediente normal com objetivo de poder, da melhor forma possível, refazer previsões e redefinir parâmetros para balizar as estratégias de investimento do Serpros.

 

Então, foi com serenidade que pudemos alcançar as rentabilidades de 14,1% no PSI e 8,2% tanto no PSII-BD quanto no PSII-CD. Esses resultados já seriam bastante expressivos se comparados às rentabilidades acumuladas no ano: (i) dos juros sem risco (CDI – Certificado de Depósito Interbancário), de 2,76%; (ii) do índice da bolsa de valores (Ibovespa), de 2,9% ou; do índice de mercado Anbima indexado à inflação do IPCA (IMA-B), de 6,4%.

 

No entanto, eles se tornam ainda mais interessantes quando compostos com os resultados auferidos em 2019, quando os Planos PSI, PSII-BD e PSII-CD renderam, respectivamente, 15,4%, 11,5% e 13,6%, enquanto os parâmetros de mercado supracitados apreciaram-se em: (i) 5,96%; (ii) 31,6% e; (iii) 23,0%.

 

Ou seja, foi possível entregar uma rentabilidade acumulada de 31,6%, 20,6% e 22,9% nos planos geridos a despeito de algumas perdas residuais oriundas dos ativos gravosos. E ainda, as metas atuarias para PSI e PSII foram de 9,2% e 9,1% em 2019 e 10,9% e 11,1% em 2020, compondo nos dois anos um acumulado de 21,1% e 21,2%, respectivamente. Tendo em vista que o ativo livre de risco paga CDI e não meta atuarial, o sarrafo que pulamos esteve deveras elevado, mas ainda assim saltamos com folga, exceto pelo PSII-BD, e por muito pouco.

 

 

Ademais, os resultados foram robustos e atravessaram momentos positivos e negativos, inclusive a pandemia de COVID-19 que foi o evento, provavelmente, mais dramático desde as Grandes Guerras. Ou seja, a estratégia de investimentos tem sido coerente e incansável em repetir que não se pode olhar os investimentos caso a caso sem considerar suas funções dentro da carteira como um todo.

 

Dando prosseguimento a este trabalho, foram propostas menos vedações nas Políticas de Investimento dos Planos, em especial no que concerne investimentos em FIP (Fundo de Investimento em Participação) e FIEX (Fundo de Investimento no Exterior). Essa discussão havia sido iniciada em 2019, mas foi recepcionada agora, após amadurecimento das ideias, ao mesmo tempo em que se discute a adequação das metas atuarias às novas realidades de taxas muitíssimo mais baixas que as de outrora.

 

Assim, seguimos tentando fazer o melhor possível para gerir os ativos e preservar a consistência dos resultados. Neste sentido, cabe lembrar de Peter Drucker, da escola austríaca de pensamento econômico, que nos ensina que “planejamento não diz respeito a decisões futuras, mas às implicações futuras de decisões presentes”.

 

Isto é, precisamos estar alertas para que as ações atuais tornem possível as futuras, quando necessário. Neste sentido, recordo-me de um amigo que fez carreira ocupando postos passíveis de influência política e, consequentemente, sujeitos à reveses. Ele conta que quando os ventos políticos viravam, havia novas nomeações e exonerações, várias vezes envolvendo mudança física de regionalidade.

 

E que, muitos comentavam, estupefatos, que meu amigo tinha uma incrível habilidade de interpretar, e se antecipar, às reviravoltas pois, sempre que surgia uma destas viagens imprevistas, lá estava ele com sua mala! Porém, o que as pessoas não sabiam, e ele confessa com um leve sorriso, é que a mala sempre esteve pronta para que ele usasse quando necessário, que nada mais é do que planejamento no exato sentido de como ações presentes possibilitam futuras.

Por fim, as estratégias de investimento continuam sendo desenhadas tentando incorporar o máximo de informação disponível e, oxalá, em 2021 não tenhamos outro erro de projeção de cenário da ordem de grandeza do ocorrido em 2020.

 

Marcelo Castello – Estrategista de Investimentos

8/2/2021

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